Ganhar dinheiro a vender fitoterapia
Deverá um acupuntor ganhar dinheiro a vender fitoterapia chinesa aos seus doentes? Será eticamente correto faze-lo? Regra geral um acupuntor compra as fórmulas por um preço e vende-as ao paciente por esse preço mais um extra que paga os portes de envio e um lucro para o acupuntor.
Um acupuntor desonesto preocupa-se essencialmente com o lucro e não necessariamente com o que é melhor para o paciente. E não vai perder tempo com considerações de foro ético sobre qual a melhor prática com a venda de fitoterapia. Um acupuntor honesto vai ter de levantar o problema e, volta e meia, vai ter de se defrontar com o mesmo. Escrevo estes artigos para esse último acupuntor.
Podem colocar-se vários problemas no modelo de funcionamento atual de vender fitoterapia ao doente. Em primeiro lugar quem nos garante que um acupuntor vai vender fitoterapia, não por ser a melhor para o paciente, mas tão somente por existir um grande stock de fórmulas de fitoterapia que ele precisa vender? Em segundo lugar quem nos garante que o acupuntor não vai vender fitoterapia que lhe dá maior percentagem de lucro?
Nos artigos seguintes iremos analisar estas 2 questões e levantar novas questões sobre este assunto.
Quem nos garante que um acupunctor não vende uma fórmula, não por ser a melhor para o paciente, mas tão somente por existir um grande stock de fórmulas que o acupunctor precisa vender?
Este problema decorre do facto do acupuntor, ou clínica, ter feito uma grande compra de fitoterápicos, antecipando a sua venda aos pacientes. Muitas clínicas fazem isto devido a alguns benefícios económicos daí decorrentes, nomeadamente; (1) compram a um preço por unidade mais barato, o que aumenta a taxa de lucro e (2) pagam menos por porte de envio por unidade o que também lhes aumenta a taxa de lucro.
Isto obviamente pode gerar necessidades na clínica, em particular: (1) vender somente aquelas fórmulas de forma a garantir retorno rapidamente e compensar o investimento inicial que foi elevado e (2) vender as fórmulas antes que prescreva a sua data de validade de forma a evitarem prejuízos. Obviamente que estas necessidades levam-nos de volta à questão com que iniciámos este capítulo.
Iremos ver à frente que a eliminação das taxas de lucro, por parte das clínicas ou dos acupuntores, pode evitar parte do problema. Não evita contudo o problema da data de validade dos fitoterápicos pois mesmo não tendo lucro o acupuntor não quer ter prejuízo ao vender fitoterapia. A pressão de não perder dinheiro pode fazer o terapeuta prescrever um fitoterápico que pode não ser o melhor para o paciente.
Existe também uma maneira eficaz de lidar com este dilema: não comprar grandes stocks de fórmulas. Eu seguia este modelo: só comprava uma fórmula quando um paciente precisava dela. Tem várias vantagens: (1) não tenho de fazer um grande esforço financeiro inicial para comprar diferentes fórmulas e (2) não tenho de me preocupar em vender todas as fórmulas dentro do seu prazo de validade para não perder dinheiro. Atualmente (revisão em 2018) e desde há alguns anos que reencaminho o paciente diretamente para o vendedor.
Infelizmente, esta solução não é livre dos seus inconvenientes. Efetivamente seguindo este modelo não podemos disponibilizar de imediato a fórmula que o paciente precisa, uma vez que ainda precisa de a encomendar. Para mim, este inconveniente compensa largamente o risco do investimento inicial na compra das fórmulas e o dilema que se me coloca caso não queira ter prejuízo com fórmulas cuja data de validade se aproxima do fim.
Quem nos garante que o acupuntor não faz venda de fitoterapia que lhe dá maior percentagem de lucro?
Uma forma do acupuntor eliminar este problema consiste em eliminar o lucro decorrente da venda de fitoterapia. Se não ganhar dinheiro com a venda de fitoterapia não tem necessidade de se focar nas gamas que mais rendimento oferecem, podendo focar-se naquelas que realmente são as melhores em termos de controlo de qualidade de metais pesados, local de produção das plantas ou o rácio de concentração da planta (6 para 1, 10 para 1, etc…) por exemplo.
Evitar o lucro seria efetivamente o mais correcto. Mas isso levanta outro problema provavelmente maior. Apesar de não regulamentadas, as medicinas alternativas começaram a desenvolver regras de mercado que fossem vantajosas para todos.
Estas regras não são absolutas e ninguém é obrigado a segui-las, mas regra geral são obedecidas. Nessa regras está estipulado que o preço de venda de fitoterapia ao público é X e o preço de venda de fitoterapia aos profissionais é X – Y. Quando um acupuntor compra um suplemento a qualquer uma das empresas existentes em Portugal (5 season´s, blue poppy, gama do giovanni maciocia, etc…) ele está a comprá-lo abaixo do preço de venda ao público e recebe informação sobre os descontos que usufruiu e o preço a que deverá vende-lo. O preço de venda ao público (PVP).
Se receber lucro da venda de fitoterapia pode gerar fricção entre fazer lucro e prescrever o melhor para o paciente, não fazer lucro pode tornar-se numa forma de violar as leis de mercado da venda de suplementos alimentares aos profissionais de acupuntura.
Tenho colegas que efetivamente não ganham dinheiro nenhum pelos suplementos que prescrevem e se recusam a ganhar dinheiro com a venda de fitoterapia. Neste caso, após a consulta, eles encaminham os doentes diretamente para essas empresas. São raros os meus colegas que fazem isto.
A grande vantagem é que não tem nenhum tipo de problema com as fórmulas que prescrevem. A desvantagem é que, em alguns casos, pode ficar mais complicado para o paciente obter as fórmulas, ou mesmo mais caro para o mesmo.
Pode parecer irónico mas a ausência de lucro do acupuntor pode ter efeitos negativos na carteira do paciente. Basicamente o paciente paga sempre o mesmo pelo suplemento. Paga o preço de venda ao público (PVP). Neste caso se o comprar diretamente à empresa que vende esses produtos pode significar pagar o preço de venda ao público mais os portes de envio. Se fosse vendido pelo acupuntor o paciente só pagaria o PVP.
Também pode ser mais inconveniente ao paciente na medida em que se precisa de deslocar novamente, para comprar determinado suplemento. Em alguns casos pode mesmo ser impossível: considere-se o paciente que não tem computador nem percebe nada de internet ter de fazer uma encomenda dos suplementos que precisa pela internet? E deslocar-se ao local de venda pode ser complicado quando a localização física da loja se encontra em Lisboa e o paciente é de Aveiro.
É minha opinião que o mais prático e simples para o paciente é comprar a fórmula na clínica. Mas isto leva-nos novamente à questão inicial: Quem nos garante que o acupuntor não vende a fitoterapia que lhe dá maior percentagem de lucro?
Talvez a resposta mais honesta seja admitir: ninguém nos garante isso em relação à conduta do acupuntor. No fundo depende mais da formação pessoal do acupuntor do que qualquer outra coisa. Pelo menos nas condições em que hoje exercemos. Uma coisa é certa. A ocasião faz o ladrão!
Revendo este artigo no início de 2018 pode-se dizer que já existe pressão para existir mudanças pois a regulamentação já vai bem mais avançada. Por lei as clinicas onde se prescrevem os fitoterápicos não os podem vender. Na minha opinião, esta lei está correta e defende os interesses dos doentes de comportamentos rapina não controláveis por parte das clínicas e dos acupuntores.
Qual a minha prática no dia a dia relativa à venda de fitoterapia aos doentes?
Depois de escrever sobre a venda de fitoterapia (suplementos alimentares) e a corrupção que se pode gerar à volta dos mesmos, acho que seria intelectualmente desonesto se, pelo menos, não descrevesse a minha prática relativa à venda de fitoterapia aos meus doentes.
Ao longo dos últimos 15 anos dei consultas em clínicas que vendiam fitoterápicos aos pacientes. No entanto nunca achei correto ganhar dinheiro a vender fitoterapia e o lucro sempre ficou para a clínica sem existir pressão no sentido de vender fitoterapia. No meu gabinete, na atualidade, não se vende fitoterapia sendo os pacientes direcionados para as empresas do setor.
Obviamente que a escolha das gamas está sempre condicionada pela minha experiência e conhecimento das mesmas. Noutro artigo falarei sobre as diferentes gamas existentes e aquelas que mais uso e maior confiança oferecem.
Qual o modelo que eu acharia ideal?
Apesar de existirem diferentes modelos em diferentes clínicas de acupuntura, onde dou consultas, gostaria também de lançar em discussão o modelo que eu acharia mais apelativo. O problema do modelo ideal é encontrar-se dependente da regulamentação destas áreas, enquanto os modelos em discussão foram criados num ambiente de total ausência de leis que direcionem o comportamento dos acupuntores.
O meu modelo ideal seria semelhante à venda de medicamentos existente atualmente. Considero muito melhor ao existente atualmente para os suplementos alimentares.
As fórmulas patenteadas chinesas deveriam ser vendidas em farmácias, o lucro que gerasse a sua venda deveria ser independente do lucro dos acupuntores que as prescrevem, deveria existir uma entidade que controlasse a qualidade das fórmulas patenteadas da mesma forma que se faz com os medicamentos.
E para si qual o modelo ideal de venda de fitoterapia aos doentes?