No texto sobre holismo e empatia mostrei como muitas vezes as pessoas confundem empatia com holismo. Nesse artigo chamei a atenção para o facto de que muitas das queixas dos pacientes se devem ao facto de os médicos serem antipáticos e não dedicarem ao paciente o tempo que ele gostaria de ter. Curiosamente muitos médicos criticam acupunturistas e outros terapeutas dando a ideia que os seus resultados clínicos não se devem à arte que praticam mas tão somente à simpatia com que atendem os pacientes. “Pode ser importante para o paciente falar com alguém durante algum tempo” e outro tipo de afirmações semelhantes parecem querer justificar os resultados clínicos.
As acusações, de ambas as partes, são afirmações polidas e politicamente corretas que passam mensagens mais agressivas. Uma espécie de pontos gatilho latentes aplicados às relações inter-profissionais. E ambas tem o seu quê de verdadeiro.
Antipatias na terra da empatia
Sim, é verdade que existem muitos médicos cuja vocação para falar com o doente é quase nula. Mas isto nada tem a ver com holismo e não significa que o médico seja incapaz de tratar o paciente. E sim, é verdade que a maioria dos acupunturistas, são muito simpáticos apesar de não ser isto que seja capaz de explicar os seus resultados (e ser simpático não significa ter capacidade de falar com o paciente ou de o compreender!). Se assim fosse ninguém ia tratar dores crónicas ao acupunturista.
Qualquer psicólogo faria melhor trabalho (sem desprimor pela profissão em si. Não é nesse sentido que uso este exemplo!). A única razão que leva uns a serem mais simpáticos, ou atenciosos se preferirem, deve-se, essencialmente a uma questão económica: os pacientes pagam por essa simpatia. É algo essencialmente capitalista que está por trás desse comportamento.
Quando tirava a licenciatura em Medicina Nuclear e fazia um estágio clínico aconteceu um episódio que ilustra bem o que estou a falar. 2 doentes desistiram dos exames porque se assustaram ao saber que era usada radioactividade nos mesmos. A reacção de uma médica, de outros técnicos e minha foi quase idêntica: “ainda bem” pensámos todos, mas verbalizou a médica, “assim vamos mais cedo para casa!” Aquela médica expressou aquele sentimento porque basicamente ia ganhar o mesmo independentemente dos doentes fazerem o exame ou não. Eu fiquei contente porque não estava ali a ganhar dineiro nem a perder dinheiro. Não era algo que me afetasse. Obviamente também sorri e pensei: “se o teu ordenado dependesse desses pacientes já não ficavas contente”.
A simpatia paga-se
A razão para a simpatia não é mais do que uma forma de garantir que o paciente se sente bem atendido e não procura outra pessoa. Por isso os acupunturistas são mais simpáticos que os médicos. Nós só ganhamos consoante o número de pacientes.
Como muitos leitores já devem ter reparado o comportamento dos mesmos médicos é diferente no público e no privado. Tendem a ser mais atenciosos no privado. Uma das coisas que algumas amigas minhas, rececionistas em diferentes clínicas médicas, já notaram é que o tempo de consulta está dependente da existência ou não de um seguro. O seguro diminui o dinheiro que o médico ganha. Automaticamente o médico vê o paciente mais rapidamente dando-lhe menos atenção.
Um paciente que pague a consulta por inteiro vai ter acesso a um atendimento mais completo e demorado. O atendimento dos pacientes está muito dependente dos incentivos financeiros decorrentes do mesmo. Quando o ordenado está garantido o atendimento baixa de qualidade.
O leitor deverá ter também outro aspecto em mente: os pacientes que protestam são aqueles que também acabam por ter o melhor atendimento. Quando não se sentir bem tratada proteste. Obviamente que existem algumas diferenças de procedimentos e que condicionam o tempo de consulta. O ato de prescrever um medicamento leva 1 minuto. Um tratamento de acupuntura (colocar agulhas e deixar durante um X tempo) leva aproximadamente 1 hora. Mas isto nada tem a ver com simpatia.
No fundo chegamos à conclusão que a arquitetura renascentista das notas de 50 euros tem mais capacidade de estimular sorrisos que a arquitetura românica da notas de 10. Obviamente que existem imensos profissionais – tanto médicos como acupunturistas – que tem um real amor à profissão e tentam não discriminar os pacientes de acordo com as suas preferências arquitetónicas.
E em que grupo eu me encontro? Bem, eu gosto de pensar que tenho grande amor à profissão. É algo que realmente gosto de fazer. Mas isso também não significa que desgoste da arquitetura renascentista.
Nuno, estou entre os 2. Trabalho com medicina ocidental e com medicina oriental. O dinheiro não pode ser um final, mas uma consequencia… Canal
Creio que isso vai depender do profissional e não tanto da profissão. Há pessoas que pensam em temros de dinheiro e prestigio e outras juntam a isso um verdadeiro gosto pela profissão.
Devo também admitir que não fui totalmente justo com os médicos, em particular, quAndo falei do público. Existem outras condições que obviamente afectam a nossa análise como sejam as longas horas de trabalho e o stresse elevado a que os médicos se encontram sujeitos. Obviamente que esses factores também condicionam o tipo de atendimento que o médico faz.
Eu recebo um paciente numa hora e esse paciente pagou para ser atendido durante um hora. Enquanto eu vejo esse doente um médico é obrigado a ver dezenas no hospital público.
De qualquer forma não queria que este texto fosse considerado uma critica aos médicos porque não é. Pretendia mostrar unicamente que, muitas das vezes, a simpatia com que se atende um doente é mais uma questão económica que vocação para a profissão… independentemente da profissão. rsrsrsrs
abraço
Boa tarde,
Estou de total acordo, também não entendi como uma crítica directa aos Médicos, eu falo por experiência em toda a minha vida tive sorte nos Médicos que encontrei, ao contrário de vários pacientes que já tive…
E cheguei a conclusão que a grande diferença está no amor que temos à nossa profissão. Já falei com muitos médicos e outros profissionais de saúde sobre este assunto e estão todos de acordo quando se gosta do que se faz é outra coisa… Mesmo quando está dinheiro em jogo já conheci médicos que preferem perder dinheiro e consultar “em condições” e também já conheci profissionais de acupunctura que durante uma consulta não param de olhar para o relógio á espera que o paciente saia para entrar o seguinte…
O ideal seria haver uma maneira de se avaliar e fazer uma triagem a qualquer profissional de saúde, ficaríamos todos a ganhar!
Boas Soraia
Creio que uma das formas era seleccionar as pessoas pela sua capacidade intelectual e de diálogo, assim como a capacidade humana de querer ajudar os outros.
Já antes tinha escrito um texto sobre o que motiva as pessoas a irem para os cursos de saúde, nomeadamente, medicina ocidental e medicina chinesa e, na minha análise, encontro incentivos que considero errados como ponto de partida. Deixo-te aqui o link para que possas avaliar por ti mesma:
Espero que gostes